Quando limites são respeitados, viajar com motos de pequena cilindrada também pode ser prazeroso

Texto: Equipe Trips & Tips e Nenad Djordjevic
Fotos: Divulgação

Você já se perguntou a partir de que cilindrada uma moto pode ser usada para viajar? Se a resposta é afirmativa, pode estar certo que é uma dúvida que acomete grande parte dos motociclistas, uma vez que tamanho e potência da moto podem ser interpretados como sinônimos de conforto e segurança em uma viagem. Na maioria dos casos isso é verdadeiro, mas incompleto na essência – uma viagem motociclística incorpora, também, sabor de aventura, desejo de conhecer lugares, pessoas e, em muitos casos, adaptação a um orçamento limitado. Nesta edição tentaremos acabar com o preconceito que existe em torno das viagens com motos de baixa cilindrada e lhe mostrar, caro leitor, que uma moto de pequeno porte pode fazê-las tão ou mais interessantes e divertidas que suas “irmãs maiores”.

O motociclismo brasileiro tem evoluído de maneira rápida e contínua. Cada mercado mundial acaba se desenvolvendo em função das necessidades de seus consumidores e, em nosso caso, evoluímos a partir das motos de baixa cilindrada, de até 150 cc. Apesar do crescimento, importações e melhora no poder aquisitivo, essa faixa de cilindrada é detentora de aproximadamente 80% de toda a frota. Com o avanço da tecnologia e transferência para modelos de menor porte, o custo desses equipamentos tem se mostrado cada vez mais acessível às camadas sociais que sonham em ter seu primeiro veículo de transporte pessoal. Some-se a isso a facilidade na condução, o baixo custo de manutenção e o baixo consumo de combustível e temos uma receita de sucesso por aqui. As motos de maior cilindrada continuam (e vão continuar) a ser um sonho de consumo para a maioria, no entanto, devido à forma como são apresentadas para o público, são vistas como a única alternativa para quem quer usar uma moto também para o lazer – e isso não é bem verdade. Queremos lhe mostrar que mesmo as motos de baixa cilindrada oferecem muito em recursos, desde que sejam respeitados alguns limites.

De maneira geral, as motos “populares” – na faixa entre 125 e 150cc – têm características essencialmente urbanas, desenhadas para facilitar a locomoção em espaços congestionados por veículos bem maiores. Apesar desse aspecto, seu desempenho e capacidade de carga podem ser utilizados também em um ambiente estradeiro e até mesmo fora-de-estrada. Um de seus atributos mais salientes é a economia de combustível – alguns modelos conseguem produzir médias de até 40 km por litro de combustível – indicando poder percorrer grandes distâncias, algo desejável em viagens. Apesar do porte pequeno, a evolução tecnológica colocou-as em um patamar de desempenho bastante alto, permitindo que motos nessa faixa de cilindrada possam produzir velocidades de 100 km/h mesmo carregadas até seu limite. Essa elasticidade permite que possam ser usadas em ambientes que originalmente são desenhados para veículos com capacidades de locomoção bem superior – mesmo não interagindo de forma ideal. Outra característica que salienta sua vocação “viajante” é o baixo custo de manutenção – seja preventiva ou em viagem. Como essas motos têm seu custo inicial relativamente acessível, e se destacam pela robustez e durabilidade, acabam sendo utilizadas por quem está começando no Motociclismo – e muitos de nós fazemos isso ainda jovens, quando nossa situação financeira ainda é instável. Mais um ponto que faz de uma motocicleta “pequena” uma  grande aliada.

Não devem ser vistas apenas como uma possível falta de opção para mudar de ares – muitas vezes são a alternativa mais viável para um determinado tipo de roteiro. Uma viagem onde se encontrará trânsito urbano muito pesado em grande parte do tempo, um caminho onde o pavimento é muito irregular e dificulta a condução de motos pesadas ou mesmo a simples vontade de fazer uma viagem mais leve e contemplativa, onde se busca uma maior interação com a natureza, são razões que apontam para a moto de pequeno porte como uma parceira ideal. Além disso, há a vontade dos motociclistas mais antigos e experientes de resgatar os tempos de início da vida motociclística, quando normalmente usavam motos pequenas que causavam emoções enormes, novas e prazerosas. Esta “volta às origens” é um poderoso “rejuvenescedor”.

Como se pode ver, são muitos os argumentos que sinalizam a viabilidade de uso de motos de baixa cilindrada também em viagens, desde que respeitados os limites operacionais que, por si, definem a forma com que se dará uma viagem. Veja a seguir algumas dicas para se preparar e usufruir de sua “pequitita” em um lazer saudável para o corpo e a alma:

– Conheça sua moto: leia o manual do proprietário, familiarize-se com suas capacidades e não ultrapasse os limites impostos pelo fabricante. Dessa forma, garante-se a utilização por longos períodos de tempo, minimizam-se os custos de manutenção e garante-se a longevidade de seu “brinquedo”.

– Planeje seu roteiro em função das capacidades da moto: se ela não consegue produzir velocidades médias de uma estrada interestadual, por exemplo, opte por estradas secundárias, que não exijam tanto de seu desempenho; e você ainda poderá ser brindado com paisagens que, de outra forma, lhe escapariam. Lembre-se que chegar ao seu destino é tão importante quanto a “forma” de se chegar lá – não tenha pressa. Saboreie cada quilômetro de aventura.

– Equipamento de segurança: sempre pilote bem equipado. Não é porque está em uma moto pequena que o dano que esta pode produzir também o será. Use bom capacete, luvas e vestimentas próprias para o Motociclismo. Jamais pilote sob influência de qualquer substância que possa diminuir sua capacidade de raciocínio e reflexo.

– Desempenho: tenha em mente que uma moto de baixa cilindrada não tem o mesmo desempenho de um carro simples. E se considerar ainda a carga, fica mais defasada ainda. Antes de enfrentar a estrada, experimente a moto já configurada para a viagem em um ambiente menos hostil, para garantir o conhecimento de suas capacidades de aceleração, retomada e frenagem – assim saberá com o que contar em diferentes situações de estrada. Considere que terá de prestar bastante atenção à atuação dos outros veículos, principalmente porque será ultrapassado com maior frequência. Fique atento ao seu posicionamento e visibilidade para não sofrer uma colisão traseira. Dê especial atenção ao ajuste dos espelhos retrovisores.

– Mantenha sua moto revisada: antes de cada viagem, observe o estado dos pneus e considere substituí-los por novos. Sempre adote a calibragem oferecida pelo fabricante e inclua em sua bagagem um kit para reparos de furos. Verifique o nível e estado do óleo lubrificante, substituindo-o se necessário. O óleo é essencial para o bom funcionamento do motor. Verifique também a condição da relação (corrente-coroa-pinhão), mantendo-a limpa e lubrificada.

– Carregue sua moto dentro de limites: além de atentar à quantidade de bagagem que pode carregar, preste atenção em como a distribui na moto para não comprometer sua dirigibilidade. Opte sempre em distribuir a carga, equilibrando-a entre lateral direita, esquerda, sobre o banco ou em fixação sobre o tanque. Uma carga bem distribuída deixa a moto mais estável.

– Consumo: fique atento ao consumo, fazendo medições a cada re-abastecimento. É provável que a carga maior em uma viagem determine um maior consumo, mas a forma de pilotar também influencia essa média. Procure estabelecer velocidades de cruzeiro compatíveis com a via e a capacidade de produção de sua moto.

-Pilotagem: redobre a atenção e pilote delicadamente. Com a moto carregada, a pilotagem deve ser muito mais suave. Preste atenção às distâncias necessárias, principalmente em retomadas e frenagens. Fique atento quanto ao comportamento da moto em curva – o peso extra deve ser gerenciado com cuidado. Em estradas de maior velocidade, fique atento às instabilidades aerodinâmicas, evitando a proximidade com veículos grandes que deslocam enormes camadas de ar à sua volta.

O importante, mesmo, é que você tenha a perspectiva de que não é porque possui uma moto de pequena cilindrada que está preso a um único uso. As desculpas acabaram – explore as capacidades de seu equipamento com sabedoria e bom senso e será recompensado com horas e horas de aventuras. Você não precisa esperar ter um modelo maior para viajar de moto. Para os motociclistas mais experientes, as viagens com motos pequenas sempre foram as que renderam as mais divertidas histórias para contar.

Construa a sua!

*Matéria publicada na edição #118 da revista Moto Adventure.